segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Um corpo dentro do corpo

um ovo

“Era como se eu estivesse perdida
não lembrava quem eu tinha sido e não sabia em quem eu ia me tornar
quando tive a certeza que geraria uma pessoa dentro de mim, sentia um foco;
um direcionamento de uma energia interna; como se algo orgânico, interno, fizesse sentido naquele momento
tinha um buraco dentro do corpo, agora esse buraco fazia sentido, algo acontecia naquela caverna que era o meu próprio corpo e ao mesmo tempo um lugar no mundo
as vezes perdia o espaço, pisava sem tocar o chão,
comecei a habitar o espaço, a vida,
algo se expandia, meu corpo habitava e expandia
outro corpo habitava meu corpo, meu corpo habitava outro corpo, o mundo
um corpo dentro do corpo
o corpo passou a estar dentro de outro corpo
descobri o espaço
o mundo aumentando para dentro do corpo e para fora, para o mundo
era único, um único instante orgânico temporário e era o óbvio, a natureza, o mais simples
o que sempre esteve na cara, na rua, em todas as pessoas
depois estranhou, o corpo estranhava
o que habitava tornou-se maior, cada dia maior e mais inteiro
o corpo dentro do corpo era: partes, pé, mão.
tornou-se cruel, humano, pesado
tomou espaço; alterou o equilíbrio, o sono,
o passo ficou lento, o corpo outro corpo,
o corpo dentro do corpo foi ficando autônomo, era mesmo outro
um dia rasgou-se
o corpo tinha ficado tão grande que precisava atravessar, rasgar, gritar
o meu corpo ficou bicho, beirou a morte
alucinado não conhecia como nasciam os bebês
9 meses de formação e 20 horas de abertura e despedida
uma explosão
olhos sol

um ovo tinha se tornado gente

Luciana Navarro
(escrito em 2009, depois de ter parido sua filha nina)
Um relato tocante e intenso sobre um nascimento, porém, acima de tudo, sobre autoconhecimento e autodescoberta - Partejar 08/10/2011

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